Desde março, quando foi registrada a primeira morte pelo coronavírus no Rio Grande do Sul, pouco mudou no perfil das vítimas fatais: em geral, homens de cor branca e idade acima de 60 anos. Mas o fenômeno que mostra um ritmo de contágio acelerado entre adolescentes de 15 a 19 anos e jovens entre 20 e 29 anos no Estado ao longo de novembro indica uma outra realidade entre os óbitos. Mesmo com a maior incidência de casos em jovens nas últimas semanas, são os idosos que têm morrido ainda mais nesta segunda onda da pandemia.
Entre março e outubro, 80,24% das mortes registradas foram de pessoas com 60 anos ou mais. Já de novembro até a última segunda-feira (7), o total de óbitos nessa faixa etária chegou a 83,88%, com um aumento principalmente no número de vítimas fatais do coronavírus entre 70 e 79 anos de idade.
Nesse período, houve 7.183 mortes no Estado. O sexo masculino responde por 55% dos óbitos, e a faixa etária acima de 80 anos de idade apresenta o mais alto percentual entre todas, com 29% dos registros — a população entre 70 e 79 anos aparece logo em seguida, com 28%.
— A senilidade acarreta redução das defesas, das imunidades, para toda e qualquer infecção, seja ela bacteriana, seja ela viral. O idoso perde a memória imunológica e, assim, tem maior dificuldade de enfrentar as doenças. Soma-se a isso que muitos deles chegam à terceira idade agregando várias doenças, diabéticos que têm também asma, que são tabagistas de longa data, disfunções que fragilizam ainda mais a saúde — diz a médica infectologista Marta Fragoso, do Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
As vítimas no Rio Grande do Sul entre 50 a 59 anos somam cerca de 11% desde março, com pouca variação nos últimos meses, e um entre cada 10 mortos contava menos de 50 anos. A grande maioria dos óbitos envolveu ainda portadores de outras doenças associadas, como complicações cardíacas ou diabetes. Nove de cada 10 pessoas que morreram com o coronavírus tinham pelo menos uma comorbidade.
Levados em consideração todos os idosos (com pelo menos 60 anos), oito em cada 10 mortos pelo coronavírus no Estado se encaixam nessa condição. Embora os mais velhos sejam o principal alvo da forma mais grave da doença, é importante ressaltar que os gaúchos mais jovens não se encontram completamente a salvo da pandemia.
Baixa letalidade entre os jovens
Especialistas apontam que o incremento no ritmo de contágios no Estado, em especial nos jovens, ganhou força a partir da segunda quinzena de outubro. Desde então, o retorno das temperaturas amenas, os feriados prolongados e até mesmo as eleições municipais levaram a um aumento na circulação de pessoas. Com isso, aglomerações se tornaram mais frequentes e isso está se refletindo em novos casos de covid-19.
Ainda que representem 24% dos casos de covid-19 no Rio Grande do Sul em novembro, os jovens de 15 a 29 anos estão ligados a apenas 0,4% dos óbitos provocados pela doença no período. A baixa letalidade nesta camada da população também é encarada pelos infectologistas como um possível motivo para que ela esteja se resguardando menos e, por vezes, protagonizando aglomerações.
O chefe do serviço de infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Eduardo Sprinz, constata que são raros os casos de pessoas de até 29 anos hospitalizadas neste momento, mas isso não significa que a evolução da doença nesses grupos não preocupe quem está na linha de frente do combate à doença.
— Os jovens, em sua maioria, podem até não ter um curso complicado da infecção. Mas eles estão circulando e podem transmitir para outras pessoas mais vulneráveis que poderão, sim, se complicar — ressalta Sprinz.
O médico alerta ainda que a perspectiva em relação à evolução da pandemia nas próximas semanas é preocupante. Por isso, ele faz um apelo para que as pessoas, sobretudo os jovens, evitem aglomerações e reforcem os cuidados pessoais, como o uso de máscara e álcool gel, e lembra que a vacina contra a covid-19 está cada vez mais perto de ser disponibilizada.